Condege publica nota técnica apontando ilegalidade e ineficácia na regulamentação por decreto do mínimo existencial

O Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos Gerais (Condege) publicou nota técnica manifestando preocupação com o Decreto 11.150/2022, assinado pelo Presidente da República, que regulamenta o Código de Defesa do Consumidor no que toca ao chamado mínimo existencial, estabelecendo parâmetros de proteção com base em percentual máximo do salário de consumidores/as que pode ser comprometido com débitos financeiros. O decreto estipula o mínimo necessário à sobrevivência das pessoas superendividadas em apenas 25% do salário mínimo vigente, o que, em valores atuais, equivale a R$ 303 mensais. Na prática, isso significa que bancos e financeiras poderão comprometer toda a renda das pessoas endividadas que excedam esse valor.

De acordo com a nota, o decreto promove esvaziamento da Lei 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento, que alterou o Código de Defesa do Consumidor (CDC) para tratar do tema. O Conselho entende que a regulamentação do mínimo existencial por decreto deve respeitar o sentido da lei, sobretudo no que diz respeito ao princípio de prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor, sob pena de nulidade, uma vez que contradiz as diretrizes da norma a que é subordinado.

O regulamento publicado, segundo a nota técnica do Condege, estimula o fornecimento irresponsável de crédito e o superendividamento, violando direitos dos/as consumidores/as, especialmente daqueles/as em situação de vulnerabilidade, pois “autoriza que as instituições financeiras realizem empréstimos desde que a prestação mensal preserve apenas R$ 303 da renda mensal do devedor, em evidente abuso de direito e em contrariedade aos art. 6º, inciso XI, e 54-D, inciso II, do CDC”.

O Conselho defende a definição do mínimo existencial para fins de revisão e repactuação dos débitos deve ser feita a partir da análise da realidade socioeconômica de cada pessoa superendividada, apontando que o valor estipulado sequer comporta a aquisição de uma cesta básica. Ressalta ainda a realidade atual de mais de 44 milhões pessoas brasileiras superendividadas.

“A Lei nº 14.181/21, ao buscar evitar a exclusão social, visa garantir os fundamentos constitucionais da cidadania (inclusive em sua dimensão financeira) e da dignidade da pessoa humana, (art. 1º, II e III, da CF – Constituição Federal)”, consta no documento. “Neste contexto constitucional, o mínimo existencial não se limita ao mínimo vital, isto é, ao estritamente necessário à sobrevivência, garantindo, assim, uma vida condigna à pessoa superendividada, preservando-lhe o bem-estar físico, mental e social e salvaguardando os direitos sociais à educação, saúde, alimentação, trabalho, moradia, transporte, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e infância.”

A nota refere ainda que o decreto trata o mínimo existencial como um valor fixo e calculado sobre o piso nacional, sem considerar, por exemplo, quantas pessoas seriam sustentadas por aquela renda.

Leia aqui a nota técnica na íntegra